24 de jun. de 2008

QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?

Observe os exames neurológicos das pacientes 1 e 2. Qual o significado dessas alterações? (não o diagnóstico da doença, e sim a localização da lesão, classificação da lesão medular, diferença entre os quadros clínicos e significado clínico)

1) Paciente SRD, encontrada abandonada há 2 meses, paraplégica. Havia sido diagnosticado fratura compressiva entre vértebras T13-L1. Foi tratada e agora foi trazida para consulta por apresentar um andar incoordenado. Observa-se no exame que apesar da paciente caminhar, há ataxia e diminuição das reações posturais em membros posteriores. Os reflexos são difícies de serem realizados nestes membros, pois a paciente apresenta espasticidade e extensão dos mesmos em momentos aleatórios. Reflexo interdigital presente e sensibilidade profunda ausente.

2) Teckel de 5 anos, com paraplegia aguda há 2 dias. Reações posturais ausentes em membros posteriores, reflexos espinhais presentes nos posteriores, reflexo interdigital e sensibilidade profunda presentes em membros posteriores.

18 de jun. de 2008

DOENÇA DO DISCO INTERVERTEBRAL EM CÃES - CONTROVÉRSIAS

A doença do disco intervertebral é reconhecida há muito tempo como causa de dor, incapacidade e até óbito em cães. Na doença do disco tipo I, em que ocorre extrusão do núcleo pulposo, a principal conseqüência é a lesão medular compressiva e concussiva. Assim, as principais controvérsias são:
Terminologia: protrusão, prolapso, ruptura, doença do disco, hérnia, protrusão. Cada um destes termos podem ser interpretados de maneiras diferentes por diferentes pessoas, mas é importante reconhecer que na chamada doença do disco tipo I ocorre ruptura do anel fibroso e presença de material dentro do canal medular, comprimindo a medula espinhal. Ocasionalmente o material desloca-se lateralmente, comprimindo a raiz nervosa.
Diagnóstico: a chave para o tratamento é o correto diagnóstico (clínico). Para isso deve-se realizar o exame neurológico, com a localização da lesão (síndrome medular), e determinação do grau de lesão medular, pela observação da presença ou ausência de sensibilidade dolorosa superficial e profunda. O prognóstico depende também da forma de apresentação da doença (aguda, crônica, velocidade com que o material do disco se deslocou e tempo de permanência do material no canal medular). A confirmação do diagnóstico é realizada por técnicas de imagem como mielografia, tomografia ou ressonância. A radiografia simples pode não auxiliar o veterinário, principalmente:
- se o animal não estiver anestesiado,
-se existirem vários discos calcificados (como na figura ao lado, onde a mielografia não evidenciou compressão medular, apesar de vários discos calcificados estarem presentes >),
-forem observadas várias espondiloses deformantes, como na figura abaixo.










Além disso, quando o grau de lesão medular indicar a necessidade de cirurgia, é essencial o diagnóstico correto com técnicas mais avançadas, como TC ou mielografia (figura abaixo).











Assim, as radiografias simples auxiliam na determinação de outra causa para a paralisia, como discoespondilite, fraturas ou neoplasias ósseas. Se o grau de lesão (determinado clinicamente) indicar que o tratamento será clínico, não há diferença saber se a extrusão ocorreu em T13-L1 ou L2-L3.

Tratamento:

Uso de corticóides - O tratamento médico de cães com lesão medular é controverso, envolvendo o uso de protocolos adotados da medicina humana, pois faltam resultados de estudos prospectivos em medicina veterinária. Os glicocorticóides são usados extensivamente desde 1960 no tratamento clínico do trauma medular, com o intuito de reduzir o edema, a inflamação e as lesões vasculares que ocorrem após o trauma agudo à medula espinhal. Em dosagens mais altas, os corticóides parecem atuar melhorando o fluxo sangüíneo e protegendo o tecido neuronal contra os efeitos citotóxicos dos radicais livres . Apesar do uso amplo e empírico dos corticóides, os benefícios deste fármaco são conflitantes. A avaliação dos seus efeitos torna-se complicada pela variação nas dosagens utilizadas, inclusive com momentos de administração e duração do tratamento diferentes, além de existirem controvérsias quanto a eficácia observada e mecanismo de ação.


  • O uso da dexametasona em doses altas foi associada ao aparecimento de úlceras e hemorragias gastrointestinais (15% dos pacientes), perfuração colônica, pancreatite, imunossupressão e morte (2%).
  • O succinato sódico de metilpredinisolona (SSMP) é até o presente momento considerado o fármaco de eleição no tratamento da lesão medular aguda, devido aos seus efeitos neuroprotetores contra a cascata dos eventos secundários que se desenvolvem após o trauma medular. O SSMP foi selecionado em detrimento de outros esteróides, pois o radical succinato atravessa as membranas celulares mais rapidamente do que outros radicais. Ocorre inibição da peroxidação lipídica, prevenção da isquemia progressiva, diminuição da concentração de cálcio intracelular, prevenção da degradação do tecido nervoso e inibição da hidrólise lipídica da membrana celular, via ácido araquidônico e conseqüente formação da prostaglandina PGF2a e tromboxano A2. Estes efeitos do SSMP foram observados somente com dosagens altas (30 mg/kg), muito maiores do que a dosagem anti-inflamatória (0,5 mg/kg). Preconiza-se sua administração dentro das primeiras 8 horas após o início dos sintomas, não devendo ser usados após este tempo. Uma revisão extensa dos II e III Consensos do tratamento de trauma medular em humanos concluiu que o uso do SSMP pode não ser recomendado, pois a evidência de sua eficácia é pequena. No III consenso, observa-se uma taxa seis vezes maior de morte por complicações respiratórias. Há ainda o potencial para outras complicações, como sepse, pneumonia e miopatia. Os benefícios relatados originalmente foram para os membros superiores dos humanos, não tendo ocorrido retorno à deambulação. Relata-se ainda que a utilização de doses muito altas de SSMP pode interferir na proteção neuronal normal, pela inibição da atividade das células do sistema imunológico, incluindo os macrófagos. Neste caso haveria inibição do processo de regeneração neuronal e brotamento axonal. Na experiência da autora deste blog, muitos cães recuperam-se após a cirurgia descompressiva mesmo sem o uso deste fármaco.

Uso de anti-inflamatórios não esteroidais: como a DDIV não é uma doença inflamatória, os medicamentos desta classe não tratam diretamente o problema, e sim aliviam a dor causada pela compressão das meninges ou a dor discogênica

ATENÇÃO: NÃO ASSOCIAR CORTICÓIDES COM AINEs

Uso de nutracêuticos: O uso destas substências é controverso, pois existem poucas evidências de que glucosamina/condroitina ou glicosaminoglicanas atenuem a degeneração do disco.
Tratamento conservativo x tratamento cirúrgico: A melhor forma de manejo da DDIV ainda é motivo de discussões. Há relatos de que o tratamento médico seja efetivo em até 71% nos casos leves, com tempo de recuperação entre três e 12 semanas, assim muitos cães com DDIV podem ser tratados com o uso de analgésicos e antiinflamatórios associados ao repouso absoluto sob confinamento.
Para cães com DDIV toracolombar com sintomas leves, como dor e ataxia, esse tratamento parece ser o ideal, porém existe o risco de progressão dos sintomas até culminar com paraplegia grave. A DDIV cervical tratada dessa maneira apresenta alta incidência de recidiva ou piora do quadro. Em cães com paraplegia e perda da sensibilidade profunda, o tratamento médico apresenta taxas de sucesso de 7%. O tratamento ideal para a DDIV toracolombar grau V (paraplegia com perda da dor profunda) e para a lesão cervical moderada a grave permanece controverso. Em muitos casos, devido ao pré-conceito existente quanto à falta de possibilidade de recuperação de cães com DDIV toracolombar grau V, os cães não são operados, ou são submetidos à eutanásia. Apesar da avaliação da dor profunda poder ser subjetiva, apresentar dificuldades de interpretação, e variar entre os autores, muitos animais tem potencial para recuperação, inclusive quando esta perda tenha mais de 48 horas. Cães que apresentam paraplegia e alterações no controle da micção (grau IV) estão próximos de serem grau V, caso haja falha na interpretação, mas ambos os graus devem ser operados o mais rápido possível, para evitar danos irreversíveis à medula espinhal. Em cães com tetraplegia, pode haver, após a cirurgia, se não houver um ventilador mecânico disponível, morte por parada respiratória, devido a várias causas, entre elas: Hemorragia/edema no centro respiratório bulbar, por mielopatia severa que interrompe a condução das fibras motoras aos músculos respiratórios ou po paralisia diafragmática por lesãodo nervo frênico nas lesões cervicais caudais.

Os objetivos do tratamento cirúrgico na DDIV são: a descompressão da medula espinhal, a remoção do material do interior do canal medular, a redução do edema, o alívio da dor e a prevenção de futuras extrusões. São comumente descritas duas modalidades de cirurgia para o tratamento da doença de disco no cão: a fenestração e as técnicas descompressivas. As técnicas descompressivas aplicadas na região toracolombar como a hemilaminectomia, mini-hemilaminectomia e laminectomia, e na região cervical como a hemilaminectomia e o “slot” ou fenda ventral, são usadas para remover o material do disco do interior do canal vertebral, principalmente em cães com alterações neurológicas severas, dor e presença de compressão diagnosticada na mielografia. A remoção cirúrgica do material extruso parece ter correlação direta com a recuperação.

A fenestração não remove o material do disco do canal e portanto não é um procedimento descompressivo. O princípio da fenestração é a criação de uma janela ou abertura no anel fibroso, permitindo a remoção de remanescentes do núcleo pulposo. Pode ser realizada em cães que tenham a dor de origem "discogênica" (sinais de dor que se desenvolvem na ausência de compressão medular ou radicular). A fenestração do disco afetado associada à cirurgia descompressiva evita a saída do restante do material. Já a fenestração profilática (retirada do material dos discos vizinhos ao afetado), tem como objetivo evitar futuras extrusões, já que as raças predispostas podem apresentar extrusões em diversos discos durante a vida. Porém permanece controverso qual a porcentagem de animais pode ter novas extrusões. Em um trabalho, em 187 cães com DDIV, somete 3% dos animais apresentaram uma nova lesão. Em outro trabalho, com 229 casos de DDIV toracolombar observados por mais de 3 anos (Mayhew, 2004), 19,2% apresentaram novo quadro de DDIV. Na figura ao lado está esquematizado a hemilaminectomia e retirada do material do interior do canal medular (1) e a fenestração (2).
Cirurgia minimamente invasiva: há alguns anos, em vários campos da cirurgia existe a tendência de desenvolver métodos menos invasivos de neurocirurgia, como objetivo de diminuir o tempo de recuperação, as taxas de infecção e a fibrose. Kinzel e colaboradores (2005) estudaram em 331 cães com DDIV toracolombar em vários graus a técnica de dicectomia percutânea, cujo princípio é semelhante à fenestração. Em todos os casos a doença foi confirmada por mielografia ou ressonância. Foi observado nos pacientes com graus II a IV 88,8% de recuperação e nos pacientes com grau V 38,2%.

Fenestração química: em seres humanos utiliza-se papaína ou colagenase para "dissolver" os discos. Existem alguns problemas com a extrapolação desta técnica para os cães, e o principal problema é o fato de nos seres humanos ocorrer herniação, ou seja, abaulamento sem ruptura, contendo o produto químico no interior do disco. Em cães que apresentem ruptura do anel fibroso (a maioria, pois somente uma porcentagem menor apresenta a DDIV do tipo II), pode ocorrer a entrada do produto no espaço epidural ou até subaracnoídeo, com complicações severas.

16 de jun. de 2008

Síndrome vestibular periférica congênita


Autoria: Médico Veterinário Felipe Purcell de Araújo, pós graduando da UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO, onde está realizando o mestrado. Trabalho apresentado na DISCIPLINA: AVALIAÇÃO E REPARO DAS DOENÇAS NEUROLÓGICAS

A etiologia congênita da síndrome vestibular periférica (SVP) pode ser evidenciada em filhotes de várias raças de cães como: Cocker Spaniel Inglês, Pastor Alemão, Fox Terrier, Beagle, Dobermann Pinscher e Akita, além de algumas raças de gatos como Burmes, Siamês e Tonkanes. A patogenia desta doença ainda é desconhecida. Estudos histopatologicos não confirmaram lesão inflamatória, degenerativa ou oriunda de malformação das estruturas do sistema vestibular periférico na grande maioria dos animais acometidos. As exceções foram em alguns cães da raça Dobermann que, além de apresentarem labirintite linfocítica no exame histopatológico, na análise do pedigree houve a indicação de um tipo de herança autossômica recessiva para a doença vestibular periférica associada à surdez.

Os sinais clínicos podem ser notados logo após o nascimento, ou iniciarem de forma aguda entre três e 12 semanas de vida, quando o filhote normalmente apresenta head tilt (torção de cabeça) bem acentuada do lado da lesão, andar em círculos, com ou sem quedas e rolamentos.

O nistágmo, assim como a ataxia, geralmente não estão presentes. Parte dos animais que apresentam sinais de SVP congênita também são surdos. A doença bilateral associada à surdez foi diagnosticada em filhotes de Beagles, Colies e Akitas, que apresentaram ataxia e movimentos rotatórios de cabeça perceptíveis quando estes começaram a caminhar.

Os sinais vestibulares podem regredir espontaneamente, sendo comum à persistência de head tilt por meses ou anos. Essa melhora é atribuída a compensação dos distúrbios do equilíbrio, mediada pelo sistema nervoso central, possivelmente através da visão.

Caso o animal seja surdo, esse distúrbio permanecerá por toda vida. Mesmo com a resolução total dos sintomas, estes podem recidivar em algumas semanas ou meses.
O diagnostico pode ser elaborado a partir da associação dos dados da resenha clínica e anamnese, aliados a eliminação das demais causas de doença vestibular periférica como otite média, neoplasias e pólipos. O diagnóstico diferencial pode ser feito através de hemograma completo, cuidadosa otoscopia da orelha média, além de radiografias e tomografias computadorizadas das bulas timpânicas e parte petrosa do osso temporal. Nos animais com suspeita de surdez o BAER pode ser bastante útil.
Não há tratamento específico para esta enfermidade e o seu prognóstico é reservado devido à persistência dos sinais vestibulares severos em alguns casos.
Outro distúrbio congênito que ocorre esporadicamente em filhotes é o nistágmo espontâneo sem doença vestibular. Este tipo de nistágmo pode estar associado com o desenvolvimento incompleto do quiasma óptico em cães, ou com a síndrome de Chediak-Higashi em gatos. Também não há tratamento específico para esta enfermidade.
Nas fotos, filhote de Pit Bull que apresentava síndrome vestibular periférica de origem aguda que iniciou aos 2 meses e meio de idade.









4 de jun. de 2008

PÓS OPERATÓRIO EM NEUROCIRURGIA

Muitas complicações podem ocorrer em pacientes neurocirúgicos. Para o sucesso da cirurgia é necessário conhecer as afecções e as possíveis complicações, para tratar o paciente da maneira correta. São complicações da afecção em si, da cirurgia ou do uso de certos medicamentos:
• SISTÊMICAS: Anorexia, febre
• RESPIRATÓRIAS: Dificuldade respiratória (lesões cervicais), pneumonia, dispnéia (pneumotórax)
• URINÁRIAS: retenção urinária, cistite, assaduras
• FERIDA CIRÚRGICA: Edema, hemorragia, seroma, secreção, infecção, deiscência.
• GASTROINTESTINAIS: Diarréia, vômito, hemorragia, ulcerações, alteração na cor das fezes, pancreatite
• OUTRAS: Convulsão (pós mielografia), automutilação, torção gástrica, mielomalácia, úlceras de decúbito
Assim, os cuidados devem ser intensivos, sendo necessário uma equipe preparada para dar suporte adequado aos pacientes. Os seguintes tópicos são primordiais:
  • Analgesia: repouso adequado, uso de analgésicos opióides, anti-inflamatórios não esteroidais, relaxantes musculares e acupuntura
  • Cuidados de enfermagem do paciente em decúbito: mantendo-se o animal limpo, seco e sobre local acolchoado, realizando a troca de decúbito a cada 2 a 3 horas.
  • Controle da micção: esvaziamento periódico da bexiga, ou uso de sondas de espera, associado ou não ao controle farmacológico da micção
  • Fisioterapia
  • Hidratação e Nutrição
  • Análise de todos os fármacos que o animal esteja recebendo, suas interações e efeitos colaterais